quarta-feira, 13 de maio de 2009

Soberania partidária

O recente estudo sobre a representação parlamentar em Portugal vem confirmar as raízes do apodrecer da democracia portuguesa e que só não são vistas por quem não quer, seja por ignorância, desinteresse ou interesse no actual estado de coisas.

Que a Assembleia da República é um ninho de carreiristas suportados por fidelidade acrítica ao partido, de escasso mérito representativo dos eleitores e de mais rara ainda consciência activa. Que é precisamente esse critério de nulidade intelectual que preside à escolha dos deputados, que se escudam atrás do anonimato partidário de listas opacas e votadas em bloco, esperando serem reconduzidos num próximo mandato por mostras de devoção ao aparelho, como seja o cumprimento escrupoloso da disciplina de voto. E que o resultado final é um parlamento composto de medíocres que estão lá por desejo de carreira política e não por vontade de serviço da causa pública, o que quer dizer que os deputados servem o seu interesse próprio e, por associação, o do partido antes de pensarem sequer em representar o dos eleitores que votaram neles. No final, sobra uma representação popular "fictícia e fraudulenta". Algo que já está plasmado na noção de que os deputados representam partidos e não as populações dos seus círculos eleitorais.

No entanto, discordo da autora do estudo quando ela diz que a solução não está em alterar a lei eleitoral, porque o problema está precisamente na forma como elegemos os nossos deputados: em bloco, anonimamente, sem qualquer vínculo individual entre representante e representados que permita a escolha dos deputados por nome e mérito e evite o argumento da representação partidária e consequente substituição permanente ao longo dos mandatos.

Aliás, volto a dizer o que já disse uma série de vezes: a assunção de um parlamento efectivamente representativo passa pela passagem para um regime presidencialista, para que o poder executivo seja efectivamente separado do legislativo, pondo fim ao autoritarismo rotativo que vivemos frequentemente e ao argumento da "estabilidade governativa"que justifica aberrações como a disciplina de voto. E porque os mandatos executivos deixariam de depender da composição do orgão legislativo, o parlamento seria livre para ter deputados eleitos individualmente, por nome e mérito próprios em vez de por siglas partidárias, escolhidos livremente pelos cidadãos de círculos mais pequenos e sem dependência da vontade de aparelhos, bastando a vontade dos candidatos - independentes ou não - e a dos eleitores que teriam, assim, a possibilidade de escolher entre todos os que desejam ser deputados e não apenas entre aqueles que os partidos pré-seleccionam e que, mais tarde, substituem em nome de critérios carreiristas ou privados.

Enquanto o parlamento não for livre, não haverá verdadeira representação popular; enquanto não houver representatividade de facto (e não simplesmente de jure), haverá apenas uma oligarquia partidária; e, enquanto assim for, a democracia apodrecerá. E do actual sistema eu espero mais do que uma longa decomposição: espero que morra! E quanto mais depressa melhor!

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