quinta-feira, 22 de outubro de 2009

It's Sweden, baby!

Há uns anos atrás, a Igreja Sueca enviou uma delegação à Marcha do Orgulho LGBT de Estocolmo. Sim, leram bem: uma instituição religiosa participou naquele evento que, em Portugal, ainda desperta nojo e motiva rejeição em larga escala, a começar no seio da própria comunidade homo e bissexual. Não por lá a marcha ser uma coisa "limpa" e "séria", que são eufemismos para a ausência de bichas e travestis, mas porque na Suécia parece haver maior facilidade em compreender que a coisa é feita por quem participa e não por quem fica de fora a criticar: se não te sentes representado pela Marcha, faz-te representar e participa! E a Igreja Sueca parece ter percebido isso.

Em 2006, quando eu ainda estava por terras suecas, já se ouvia falar aqui e ali da possibilidade de serem abençoados casamentos civis entre pessoas do mesmo sexo sem, no entanto, ser realizada uma cerimnónia de casamento de facto. Falei do assunto a uma sueca que morava comigo e ela puxa de uma história de família. Ela tinha um irmão mais novo - 16 ou 17 anos - que tinha assumido a sua homossexualidade perante a família uns anos antes. Dos pais nada de rejeição e, da parte do irmão mais novo, veio o gesto de meter o mano num guarda-roupa, fechar e abrir as portas e gritar: agora estás fora do armário! Pouco tempo depois, o rapaz decidiu afastar-se da paróquia local, em protesto contra a homofobia de algumas pessoas dentro da Igreja Sueca. A reacção? Os outros paroquianos convidaram-no a voltar e a expressar a sua sexualidade sem receios; que respeitavam a orientação dele e rejeitavam a discriminação defendida por outros. E nada disto com o intuito de o "curar", mas sim de o acolher como ele era, sem preconceitos.

Em 2009, a Igreja Sueca anuncia que vai realizar casamentos religiosos entre pessoas do mesmo sexo. Surpresa? Para mim, nenhuma! A decisão já andava a ser preparada há algum tempo. É a afirmação da igualdade como um príncipio que não conhece fé, tal como não conhece raça ou sexo e o reconhecimento da dignidade pública das relações homossexuais no interior de uma das grandes religiões monoteístas, precisamente a origem de muita da oposição aos direitos dos homossexuais, bissexuais e transgéneros. É um marco, tal como foi a sagração de um bispo abertamente gay há uns anos atrás nos Estados Unidos da América.

O contraste entre nós e eles não podia ser maior. De um lado, aquele país nórdico onde até uma Igreja já acolhe sem "tibiezas" casais de pessoas do mesmo sexo; do outro, este Portugal há beira-mar plantado onde o casamento civil sem que o catolicismo meta o bedelho já é uma luta e pêras. Que sirva de lição a muitos: a Suécia, que também foi afectada pela crise económica e defronta-se com a necessidade de reforma do Estado Social, não acha que isso impeça avanços na agenda LGBT. Nem é um país à beira do colapso social ou civilizacional por reconhecer a dignidade pública dos homossexuais. A Suécia, que é uma monarquia com um governo de direita, dá lições de igualdade a um Portugal republicano com um governo socialista. Que saudades das terras suecas!


Publicado em simultâneo no
Devaneios LGBT

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