segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

Matemática eleitoral

Começa a ser irritante ouvir o coro de analistas do status quo que não páram de vomitar certezas em pele de previsões sobre as consequências eleitorais das movimentações políticas à esquerda. Já ouvi uns dizerem que não acreditam que comunistas e bloquistas venham a somar coisa de 20% dos votos, que tudo isto é passageiro, que a praxis política da democracia portuguesa não prevê a criação de novos partidos (o que explicaria alguma da podridão do regime) e, como é da praxe, há sempre os comentadores ao serviço de forças partidárias que lá vão tentando puxar o eleitor à sua sardinha. Primeiro foi Marcelo Rebelo de Sousa a dizer que a perda de votos do PS para a esquerda poderia favorecer o PSD, numa esperança desesperada na subida dos sociais-democratas não por mérito próprio, mas por demérito dos socialistas. Seguiu-se Vital Moreira com um discurso no mesmo sentido, mas com uma leve variação em jeito de apelo ao voto útil.

Longe de querer entrar no mesmo jogo de divinação política, gostaria apenas de chamar a atenção para dois aspectos que me parecem estar a ser esquecidos no meio de tanta euforia estatística: o sistema eleitoral e a abstenção!

O primeiro determina que a eleição dos deputados seja feita por círculos distritais e não por um círculo nacional, de onde se extrai que 10% de votos não têm uma tradução directa em mandatos parlamentares, mas dependem da sua distribuição no mapa eleitoral. No caso do Bloco de Esquerda, interessa-lhe saber se a subida do número de votantes está concentrada nos grandes centros urbanos ou espalhada um pouco por todo o país; ou, se for uma subida com expressão rural, se será suficiente para acrescentar deputados ao somar com os votos urbanos. Duvido muito que este tipo de informação seja discernível nas famosas sondagens e parece que há muito bom analista e comentador a esquecer-se que estamos a falar de eleições legislativas e não de presidenciais: mais importante do que o número de votos é a sua distribuição!

Depois há a abstenção, esse fantasma da portuguesa democracia dita "representativa" e que tende a afectar o eleitorado menos convicto ou mais de ocasião. Em Portugal, afecta em particular aquela grande massa de eleitores que costuma decidir-se entre o PS e o PSD, volátil e flexível, mas também propensa a ficar em casa quando o grau de desilusão ou de irritação com o sistema político é grande. Em tempos de crise, de conflitualidade social e de desgaste dos dois grandes partidos - um por incompetência e o outro pelo exercício do poder - é esperar para ver os números da abstenção e descobrir até que ponto o "desaparecimento" de eleitores do centrão vai aumentar estatisticamente a percentagem de votos dos pequenos partidos e, logo, as suas hipóteses de eleger mais deputados.

E mais não escrevo sobre sondagens e previsões até às eleições de 2009.

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