segunda-feira, 11 de fevereiro de 2008

Errar é humano, rir é divino

Costuma-se dizer que não se deve rir de coisas sérias, sejam elas a morte, a doença ou deus(es). Dizem as nossas avós, dizem os nossos pais (se não forem danados para a brincadeira como os meus) e dizem as vizinhas, principalmente quando se tem a infelicidade de viver numa pequena localidade que rege o quotidiano pelo sino do campanário e sermões do altar. Eu, pelo contrário, acho que é precisamente das coisas sérias que mais se deve rir, não vão elas ser levadas demasiado a sério.

O riso é, entre outras coisas, uma reacção ao ridiculo. Rir de alguém ou de alguma coisa significa que ele ou ela caiu no ridiculo. Se o fez, é porque cometeu um erro, expôs uma falha ou demonstrou um lado menos venerável, por acção sua ou de outros. Rir de uma entidade omnisciente ou omnipotente equivale, portanto, a contradizer essa natureza absoluta: se há riso há ridiculo, se há ridiculo há falhas, mas falhas é coisa que não devia haver naquilo que é todo-poderoso. No mínimo, há a ousadia de satirizar, de criticar pelo riso, de questionar o valor de regras, conceitos e argumentos ou de usá-los fora do contexto onde são inquestionáveis. Em qualquer dos casos, está em risco o estatuto de absoluto, a noção de autoridade infalível e o ser-se venerável se isso depender da omnisciência e da omnipotência. E isto tanto é verdade para uma entidade, como para uma ideia ou um sentimento, pelo que o humor é, então, um dos melhores remédios contra dogmas e limites à liberdade de expressão.

Como eu não sou adepto de poderes inquestionáveis, acho que o direito à blasfémia é parte importante da liberdade de expressão e que as religiões devem estar sujeitas à mesma sátira e humor que qualquer outro fenómeno público da sociedade civil, apresento o Godchecker.com, sítio que recolhe com um sorriso informação sobre mais de 3400 divindades, espíritos e santos que foram ou são adoradas pelo mundo fora. Tem certamente mais deuses do que os que cabem na Rua da Betesga e são todos apresentados com uma grande dose de humor com laivos de Monty Python e Terry Practchett. A página dá que muito que rir e que aprender, está aberta a contribuições dos leitores, tem uma selecção divina diária para uma gargalhada quotidiana e ainda uma loja virtual onde nem os ateus são esquecidos. Vale bem a pena uma leitura blasfema de não-crentes e principalmente de crentes: afinal, qual é o valor de uma religião que não tolera humor sobre si mesma?

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